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Climate positive: como empresas e instituições já discutem o “dia seguinte” da descarbonização

By 22 de agosto, 2023No Comments

Com a evolução da consciência climática, governos e empresas já falam em metas mais ousadas, mas falta de regulamentação permite interpretações diversas e slogans oportunistas

O caminho para a descarbonização está posto na economia do século 21, com empresas buscando aprimorar processos e chegar ao status de carbono neutro, ou ainda, divulgando planejamentos detalhados para chegar ao net zero, quando a atividade-fim já não deposita mais carbono na atmosfera. No entanto, com a evolução da consciência climática sobre os desafios postos para manter o aquecimento global em 1,5ºC, metas mais ousadas surgem, como o conceito de climate positive, ou ainda, carbon negative, duas expressões em inglês que significam “positivo para o clima” e “negativo em carbono”, respectivamente, em tradução livre.

Foto: Getty Image

Ambas as terminações são usadas, embora climate positive apareça com mais frequência, e o significado delas ainda não é consenso, mas tem uma linha de raciocínio clara: denominam a pessoa, empresa ou país que, em sua atividade econômica, retiram mais carbono da atmosfera do que emitem. Ou seja, ao deixar o ar menos carbonizado ao fim do dia, estes atores têm uma atitude positiva para o clima. Mas não se trata apenas disso.

A falta de regulamentação ainda causa discussão no meio empresarial, uma vez que os critérios para atingir o status de climate positive ainda não são claros, permitindo interpretações diversas e slogans oportunistas.

Na Suécia, a divulgação do “primeiro hambúrguer climate positive do mundo” foi uma das campanhas mais bem-sucedidas até o momento dentro deste contexto de positividade climática. O UNFCCC, comitê da ONU para as mudanças climáticas, observa que, além do balanço positivo na geração/absorção de carbono, uma empresa deve estar alinhada a objetivos de descarbonização (net zero) para ser considerada climate positive.

O planeta já possui três nações positivas para o clima, certificadas pelas Nações Unidas. São elas Butão, Panamá e Suriname. Pequenos e cobertos por densas florestas, estes países absorvem gases estufa da atmosfera em volume maior do que o carbono gerado por indústria, transporte, energia e todas as suas cadeias de produção.

Atitudes consideradas climate positive

Quando falamos de empresas, a cartilha do carbono neutro e da net zero servem como mapa para o ponto de positividade climática. Por exemplo: recorrendo a créditos de carbono, uma empresa consegue neutralizar suas emissões, mas, se investir em créditos que superem seu impacto ambiental de gases estufa, já estaria tendo uma atitude climate positive, na leitura de algumas consultorias, como a britânica Go Climate Positive, o que estaria em desacordo com a definição da ONU.

Também pode ser considerado climate positive uma empresa que, na evolução de um planejamento para a descarbonização total, invista em plantar árvores de forma que ocorra o “efeito Butão”, ou seja, que estas plantações façam uma compensação pelo carbono emitido pelas fábricas, superando esse saldo e tornando-o positivo (esta atitude estando mais alinhada ao conceito da ONU, de compensar e descarbonizar ao mesmo tempo).

“O investimento em compensações não pode ser um substituto das ações de redução direta de emissões. Acreditamos que, mesmo que uma empresa consiga hoje compensar parte de suas emissões usando créditos de carbono, é fundamental que internalize tecnologias de baixo carbono e promova medidas disruptivas para a descarbonização de suas atividades, até a fronteira do que é possível hoje”, defende o CEBDS (Conselho Empresarial Braisleiro para Desenvolvimento Sustentável), entidade que reúne empresas de peso para o PIB nacional.

O climate positive “raiz”, portanto, é algo raro, pois parte do patamar de vida após net zero. Em sua forma ideal, a atividade econômica mais positiva possível para o clima não produz carbono, e ainda de quebra, ajuda a retirar gases estufa da atmosfera. Uma atividade econômica com este perfil demanda a união a todo vapor de nichos de ação climática e socioeconômica em desenvolvimento hoje, como o capitalismo regenerativo e a economia circular, por exemplo.

“Eu não cercaria o conceito em uma definição, pois ainda estamos descobrindo. É certo que, usado com responsabilidade, é um conceito louvável, e desde que verdadeiro deve ser valorizado. Há muitas discussões, por exemplo, sobre manter áreas de preservação. Se a área não sofre ameaça de ser derrubada, é discutível se isso é uma ação climate positive ou artifício de comunicação”, analisa Breno Rates, diretor de projetos de carbono na consultoria WayCarbon.

Mercado espera normas e segurança jurídica

A falta de uma norma consagrada é um dos fatores que mantém o conceito de climate positive em discussão. Diferentemente do “selo” de neutro em carbono, lastreado pela certificação PAS 2060, criada em 2010 pela auditoria e consultoria BSI (British Standards Institution), e dos padrões para o enquadramento de empresas em um comprometimento com o net zero, como os fixados pela SBTi (Science-Based Targets Initiative), no caso da positividade climática ainda não há organização em tal nível institucional.

A incerteza regulatória e regras caras para a economia do carbono estão entre os principais itens apontados por empresas associadas ao CEBDS como desafios para a descarbonização no Brasil. Em pesquisa publicada em junho, as companhias sondadas citaram ainda a dificuldade de engajamento da cadeia de fornecedores e a ausência de referências setoriais, o que reforça a necessidade de normas e joga luz sobre outro caminho para o climate positive: quando a empresa, já neutra, passa a descarbonizar sua cadeia, auxiliando fornecedores e prestadores de serviço.

“Os desafios apontados pelas empresas refletem a necessidade de um ambiente seguro para o investimento em novas tecnologias, já que muitas delas demandam altos investimentos. Sem as definições corretas, isso pode trazer muitos custos adicionais quando estas regras forem definidas, criando um ambiente de alta insegurança”, observa o CEBDS em nota para Um Só Planeta.

“Mesmo com essas incertezas, o setor empresarial vem construindo e implantando estratégias para operações mais limpas. Do total das participantes do estudo, 79% possuem estratégia clara para redução de emissões, e 71% já implementam ações de descarbonização em escala”, afirma o conselho. A pesquisa foi realizada em parceria com a consultoria BCG e contou com cerca de 50 companhias do Brasil, de setores como agronegócio, transporte, saneamento, mineração e energia.

Atitude positiva para o clima, um passo além

Apesar da discussão, a questão do climate positive mostra o amadurecimento da responsabilidade climática, ou seja, o compromisso da humanidade, na forma de cidadãos, empresas e instituições, para uma evolução econômica que promova a regeneração do clima no planeta, hoje sob constante estresse. A atitude positiva para o clima passa a ser, portanto, o passo seguinte na cartilha da descarbonização, que já consagrou os conceitos de neutralidade em carbono e net zero.

“Para obter certificações assim você precisa de um planejamento. [O carbono neutro] foi um primeiro passo importante, mas também alvo de críticas ao entendimento de que os créditos de carbono seriam licenças para poluir, pois empresas passaram a entender que bastava comprar créditos e não atacar a origem da questão. Para manter o aquecimento em 1,5°C, não há crédito de carbono para todos”, afirma Rates.

“O carbono neutro foca em compensar, sem meta e prazo; na lógica net zero, você tem componentes, prazos, velocidades bem estabelecidas, um lugar para os créditos de carbono… Um arcabouço bastante completo do que deve ser feito para chegarmos onde queremos chegar. Climate positive é ir além. Além do carbono neutro, além do net zero. Conforme as minhas atividades, faço meu dever de casa e vou além dele.”

Fonte: Um Só Planeta (Globo.com)